Que mais?
Que mais poderia ser tão estranho? Não saber o futuro; pra quê? Um homem se olha no espelho e reconhece tão logo a sua pessoa. Possui (ou acha que possui) um nome, que não é nem seu nem do outro, mas de tantos e pelo qual se reconhece, muito embora não o seja. Ao menos vira a cabeça quando lhe chamam, por esse nome. Vê uma imagem numa foto (tal qual a do espelho, porém tempos mais nova) e se sabe através dela; esse sou eu em Acapulco. Uns até tem seus próprios códigos: ouve um nome estranho, como amor, num certo timbre de uma certa voz e já sabe que se trata dele, ou dela, ou ele-ela dependendo do caso; Já presenciei um rapaz ao ser perguntado – quem é a pessoa mais boazinha do grupo – responder, esse sou eu – reconhecendo-se numa só qualidade.
No muito se sabe quem se é até o momento. Nunca que um homem saberá que será sua transformação daí a dez anos, e não saberá dizer que homem será ele então. (deviam dizer; até agora sou o fulano). O tal do futuro nos guarda a nós mesmo em segredo e se puder nunca nos dará nem uma pista misericordiosa. Caso saiba que realmente vá morrer e tenha fôlego ou serenidade para altos vôos de raciocínio, um homem em seu último suspiro pode olhar para traz e dizer; EU SOU ASSIM. Não antes, nem nunca se não nesta oportunidade. Tal reação química da mistura entre a mutabilidade do homem e a cegueira do futuro resulta num cu que nos caga ignorância dia a dia, noite a noite, felicidade a felicidade, certeza a certeza. Deixando-nos certos de que nada saberemos e que nunca em consciência poderíamos ser uma obra completa. Tão somente mortos. Aí sim.
Eu, que não cago ignorância, mas cago (afirmo isso tendo certeza do elevado grau de cultura das minhas fezes), sento-me no vaso e o faço. Levanto-me, passo pelo espelho e não sei quem vi. Até agora sou o Pedro, mas ainda não fomos apresentados. Tenho certeza de que sou esse cara porque está lá na carteira de identificação: Pedro Nicolau Tomé Simas – 12795325-5 IFP. Sei que sou eu, pelo simples fato de que acordo e durmo sob o mesmo ponto de vista e embora pouca, tenho memória da vida desse eu que eu sou, mas não sei quem sou eu. Tampouco sei quem sou até agora, pois até nisso me enrolo e perco. Indeciso, não me defino e nem conseguiria, pois não me reconheço a não ser pela imagem, que poderia muito bem ser uma copia de um outro eu que não conheço e que não seja eu, mas sim o eu de outro. A um tempo me disseram que um tal de Felipe era eu, ou eu era ele. Não souberam se decidir (tal como eu não me decido) quem é quem, ou se são ambos os dois. O importante é que eu não saiba nada da vida desse outro eu pra que não me confunda, mais. Já me basto com minha própria confusão que explode a cada segundo. Outra seria covardia, ou comigo, ou com ele. A quem, não importa. Sigo assim meu caminho com o único eu que desconheço até a sala onde me deparo com um livro do autor Campos de Carvalho (que não sou eu, mas a quem me sinto copiando enquanto escrevo, e não copio), jogo-o fora para não mais lembrar que não posso ser como ele, ou ao menos escrever como ele, a quem copio agora, mal e porcamente. Caguei pra tudo isso e fui pra rua.
Já um tanto inebriado de tanto pensar nas coisas que EU sei fazer, os trabalhos que EU ainda não tenho, no tanto de coisas que ninguém sabe que EU sei e se soubessem ME dariam mais oportunidade, cruzo com uma moça. Que porra é essa!! Parei simplesmente e curti o pasmo que era só meu (me foi nítido que ninguém mais percebeu o esplendor que era essa menina). Ao que recuperei o fôlego, já tinha sumido. Fiquei o resto do meu dia no mesmo lugar esperando que ela voltasse, e se voltasse não faria nada, apenas olhava de novo. Eu que sou eu mesmo faço isso frequentemente e nisso às vezes me reconheço (mas não sei que tipo de homem sou ao fazê-lo – romântico ou pervertido) e nas oportunidades que tive e quis tomar abordagem não me foi possível devido a minha própria falta de coragem. É muito triste um homem não ter oportunidade de se conhecer para saber seus limites e não tentar atropela-los, podendo maneja-los a mudar ou não. Não sei quem sou e tento amar a todas as mulheres que me encantam, sem saber que disso não sou capaz. Muito tristes são essas mulheres que passam olhando para si (sem saber quem são) e não vêem que estão sendo amadas, a cada esquina, por muitos e muitos EUs que se perdem em seus olhos e esquecem de si. Quando ama, um homem promove a oportunidade única de saber quem é. Se reconhece nos olhos de alguém que se sabe nos seus (quando cessam de amar, esquecem imediatamente quem são). Não me conheço, mas me reconheço a cada dia nos olhos das meninas que nem me vêem, e por isso não sabem quem eu sou, quem são e nem que me amam profundamente. Ter identidade é se apaixonar muito e sempre e tanto, seja você quem for. Esse sou eu.
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
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